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A questão da equidade de gêneros nas empresas vem sendo discutida em um nível de superficialidade que nos impede de avançar com qualidade e consistência na solução de um problema que, de fato, nos leva ao coração dos desafios de desenvolvimento, por um lado, e da lucratividade, por outro. Ao contrario do que se pensa, essa questão não é fruto de uma agenda feminista ou de transferência de obrigações do Estado para o setor privado. O relatório "A Armadilha do Gênero - Mulheres, Violência e Pobreza”, do Banco Mundial e dados da Organização das Nações Unidas (ONU) revelam que mais de 70% dos pobres do mundo são mulheres, do restante 30%, uma boa parte são para crianças do sexo masculino dependentes dessas mulheres, o que coloca mulheres e crianças até 10 anos entre a maioria absoluta (cerca de 86%) dos pobres do mundo. Segundo o GENDER EQUALITY AND DEVELOPMENT (World Development Report 2012 do BANCO MUNDIAL) há uma relação direta entre desigualdade entre os gêneros e pobreza. Países mais desiguais são mais pobres. A situação das mulheres está diretamente relacionada com a fragilidade da infância, com a evasão escolar, com as altas taxas de mortalidade infantil e impactos significativos no meio ambiente. Não é possível pensar em desenvolvimento sustentável sem tratar da questão de gênero.

No Brasil, dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios de 2001) mostram que a taxa de desemprego das mulheres é cerca de 58% maior do que a dos homens e que os rendimentos médios são 21% inferiores por horas trabalhadas. Dos indivíduos com mais de 15 anos de estudo, a renda das mulheres é 39% menor. O quadro é mais grave nas classes populares e para algumas minorias. Mulheres negras recebem em média 61% a menos que os homens. Por outro lado, o número de lares chefiados por mulheres cresce. Passaram de 19,3% em 1992 para 32% em 2002. As pesquisas mostram que 90% dessas mulheres são as únicas provedoras dos seus lares. Soma-se a isso o fato de que o cuidado com as crianças foi delegado quase que integralmente para as mulheres.

Dentre as várias causas dessa situação está a discriminação no ambiente de trabalho e a falta de suporte para a maternidade. Por outro lado, vivemos um quadro de escassez de talentos. As empresas têm dificuldades de atrair e reter pessoas bem formadas e comprometidas. As mulheres já são a maioria dos egressos dos cursos superiores no Brasil e nas pesquisas de engajamento de várias empresas despontam como o grupo mais comprometido. Apesar disso, apresentam a maior evasão de emprego justamente na fase mais produtiva da carreira pela impossibilidade de conciliar emprego e maternidade. Isso é fruto de uma visão equivocada sobre essa questão para as empresas brasileiras. Enquanto nos países mais iguais os gestores são cobrados por estar no ranking das melhores empresas para as mães trabalharem, para atrair as melhores alunas das melhores universidades, muitas das empresas brasileiras as excluem. A preferência por homens brancos acaba levando a um quadro de seleção adversa (prefere-se um homem menos capaz a uma mulher) e ausência de meritocracia, que afeta negativamente a capacidade de inovar e gerir conhecimentos. Isso revela a preferência por indicadores de produtividade física do trabalho em detrimento de outros fatores, e é uma evidência da baixa qualidade da gestão. Há aqui uma grande oportunidade, ainda não explorada, de interação entre empresas e governos voltada para ações de desenvolvimento de fato transformadoras da sociedade brasileira.

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